Causos Amazônicos: o menino encantado de corpo e alma

Causos Amazônicos: o menino encantado de corpo e alma

Rômulo Viana.

O acontecido é de muito tempo atrás. Aconteceu ali pelas mediações do Arumã, Flexal, Igarapé-açu comunidades da Óbidos Amazônica. Ciloca, ainda no vigor da juventude, acabara de bater o açaí quando desceu, por volta do meio dia, para lavar as peneiras e as vasilhas no igarapé. O menino de cinco anos correu na frente com a peneirinha na mão. Quando a mãe chegou com as demais vasilhas viu que a criança, misteriosamente, havia desaparecido ficando somente a peneira boiando sobre as águas. O desespero foi imediato. A mãe logo gritou despertando a preocupação dos moradores. Num instante, metade do vilarejo estava ali numa busca desenfreada pela criança. Homens na água, na mata... mas nada do curumim. Quando o sol já começava a dar sinais de despedida, um velho senhor lançou a suspeita de o caso ser de encante. E se de encante fosse, somente mestre Pacífico seria capaz de desfazer.

Mestre Pacífico, como se costuma dizer por aqui, era da época dos antigos, sexagenário descendente dos tapuias de quem herdara os dons do curandeirismo. O velho disse com a firmeza da certeza de que o menino havia sido levado pela mãe do igarapé, mas que a mãe não se preocupasse, pois o menino iria ser bem tratado, e se ela ainda o quisesse ver pela última vez, a mãe do igarapé, depois de oito dias, iria emergir a criança das águas. A mãe cuidou de preparar os remédios ensinados pelo velho curandeiro. Depois de oito dias retornaram então ao local do sumiço da criança.

Por volta do meio dia, hora em que a criança havia sido levada pelas águas, conforme ensinado pelo mestre, a mãe despachou “os remédios” na beira do igarapé. Minutos depois, a criança emergiu das aguas segurada por duas mãos. Ciloca correu para pegar o filho, mas este desapareceu rapidamente para todo o sempre.

Há, até hoje, quem diga que depois desse episódio ouviu-se em toda a comunidade barulhos de uma festa que parecia vir do fundo das águas do igarapé. O barulho durou três dias e facilmente se podia ouvir o som de tambor, clarinete, saxofone e outros instrumentos musicais.

(causo reescrito a partir do relato do senhor Maisses Gomes, 79 anos).

Rômulo Viana, Especialista em Literatura.

Técnico em Assuntos Educacionais da UFOPA Campus Óbidos.

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