COMO ERA ÓBIDOS SEM CARROS!

COMO ERA ÓBIDOS SEM CARROS!

Dino Priante. 

Sou de uma época que quase não havia meio de transporte urbano em nossa cidade, os carros de bois transitavam pelas ruas de terra, e algumas pessoas, principalmente os colonos, vindos do Curuçambá, Cipoal, Canta Galo, Rio Branco e outros locais aos arredores de Óbidos, chegavam à cidade montado em seus cavalos ou em bovinos, pois inclusive motos só havia duas, uma era do Sr. Wallace (funcionário do BB) outra era do italiano Giovanni Pontillo (trabalhava na loja do Sr. Careca), e as vespas dos freis Rodolfo e Prudêncio, os carros, além do Jipe do Dr. Chaves prefeito da Cidade, tinha a Garapeira que era a caçamba da PMO e o caminhão do José Guilherme.

Transporte fluvial eram as canoas a remo e os motores de popas que predominavam. Mas já havia alguns barcos, em que as máquinas ainda eram de cabeça quente, ou seja, necessitavam de um maçarico para colocar em funcionamento, das marcas Lister, Bolinder, Scania. Nessa época os barcos mais chiques eram o SIALPEda Cia Paulista de Aniagem, o NAIB do Sr. Chico Coelho, METRÓPOLE do Sr. Guilherme Barros, bem depois o RADIANTE do Sr. Brito Souza.

Os leitores mais novos devem estar se perguntando, de que maneira se fazia uma mudança, os casamentos, como se conduzia os doentes ao hospital e outras necessidades que hoje é difícil de imaginar como era possível se viver sem carros. Só uns detalhes, os pontos extremos de Óbidos, eram: a beira, Juncal, Cemitério, Santa Terezinha.

Bem, os doentes que vinham do interior, eram carregados em uma rede, com um mará (vara) enfiado nos punhos, e conduzidos por dois homens, os moradores urbanos, eram transportados sentados em cadeiras geralmente de vimi, dessa maneira chegavam até a Santa Casa. Os enterros eram feitos todos a pé, as urnas eram transportadas por seis ou quatro pessoas, e dois ajudantes com duas cadeiras de abrir e fechar para descanso e troca dos carregadores. Os casamentos, quando eram realizados nas casas das noivas, os padres e juízes iam até essas residências efetuá-los, ao passo que na igreja, os noivos seguiam a pé da residência da noiva, acompanhados pelos parentes e convidados mais íntimos até a Matriz de Sant’Ana,  onde a maioria dos convidados já os aguardava. Após a cerimônia voltavam para o local da comemoração, onde a tartaruga predominava o cardápio, para degustação dos presentes.

Os carregadores, eram como chamávamos aqueles homens que trabalhavam no porto da cidade, tinham bastantes serviços, quando chegavam àqueles viajantes, através das asas dos aviões da Panair do Brasil, que amerrisavam no Rio Amazonas, se dirigiam as únicas pensões da cidade, Miquita ou Brás Bello, suas bagagens eram transportadas pelos carregadores: Jacaré, Avinte, Burro Cego, Firmo e outros, quando havia muitos volumes, tinham os carros de mão, davam a volta pela Rua do Curro (Justo Chermont) fugindo da ladeira do Mercado.

Quando começou a chegar alguns caminhões, como do Sr. Pedro Nolasco, Sr. Lucas Menezes e mais o do José Guilherme que já existia, as famílias se juntavam e fretavam para ir tomar um banho nas águas gélidas do Curuçambá, recordo que as cervejas e refrigerantes, eram colocadas submersas dentro da água do igarapé, debaixo da ponte para esfriar e não ter que tomar quente, pois desconhecíamos os isopores. Vida difícil, não!

Tem um acontecimento que até hoje, guardo em minha memória. Tínhamos uma moça que trabalhava em nossa casa, era o ano de 1958, possivelmente mês de janeiro, é o mês que começa a dar pitombas, essa moça subiu na pitombeira no quintal de casa, eu ainda muito criança com trajes de dormir, pois era cedo, aparava os cachos que ela jogava de cima, de repente ela pisou em um galho seco e desabou, eu me afastei, veio direto ao chão (não tinha como protegê-la), ficou desacordada, em desabalada carreira fui avisar o papai que estava no comércio, nesse momento estavam diversos estivadores na esquina da loja, lembro que papai chamou o Sr. Janari, Peba, Santa Cruz e o Jacaré e ordenou essas pessoas fossem correndo até o local do acidente e a levasse para a Santa Casa (antiga), enquanto meu pai fechava a loja. Essa moça, foi atendida pelo Dr. Bezerra, era genro do Sr. Samuel Cohen, o tratamento foi gelo na cabeça e muita reza, nessa época não havia nem raios-X, imaginem ultrassom, tomografia, ressonância e outras parafernálias de hoje. Mas não houve fraturas, apenas um corte profundo no rosto, que levou alguns pontos e bateu a cabeça, mas sem sequelas maiores, após três dias hospitalizada retornou para casa.

Nessas últimas cinco décadas, houve uma grande evolução mundial. Quando não se conhece a nova tecnologia, vamos vivendo como dá, após conhecê-las fica quase impossível viver sem. Quem de nós, nos dias de hoje, poderíamos conviver sem celular e internet? 

 PRIANTE, Dino. ÓBIDOS DE ANTANHO: Livro de crônicas de Dino Priante (2019)

Publicado originalmente: 02 de Junho de 2018

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