Formas Navegatórias, nova exposição de Klinger Carvalho em São Paulo

Formas Navegatórias, nova exposição de Klinger Carvalho em São Paulo

A abertura da Exposição de Kinger Carvalho, Formas Navegatórias, aconteceu no dia 30 de novembro e irá até 20 de dezembro de 2019, na Galeria Kogan Amaro São Paulo.

Desde o ano de 1999, Klinger Carvalho, artista multimídia, faz uso de materiais e técnicas diversas para criar suas esculturas que vêm se caracterizando pela experimentação plástica. É dos artistas que não se prendem a um receituário para criar. O que busca nessa diversidade são os meios para comunicar e expressar as necessidades visuais e conceituais de sua obra.

Para a exposição Formas Navegatórias, sua primeira individual na Galeria Kogan Amaro, em São Paulo, o artista preparou uma série de trabalhos baseados na sua memória e conhecimento náutico, transformando formas navegatórias básicas, o esqueleto dos barcos, em desenhos  escultóricos. Na verdade, é a materialização do seu pensamento plástico em linhas que não se quebram, são arredondadas e se juntam nas extremidades e expandem pelo espaço dando forma para suas ideias.

Um rio dentro do artista navega na nossa direção. Há um rio dentro de Klinger Carvalho que transborda na materialidade da sua memória. Não à toa, melhor, quero dizer que não veio do nada, “tudo começou com um barco, que, preso em uma jaula, serve como metáfora do estranho encontro entre si e o distante. Notícias do que recebe por um lado, experiências do que foi descoberto por outro. Outro no qual descreve o espaço incomum do novo mundo; em que se entrecruzam projeções e ideologias de tal forma que a realidade se manifesta como algo construído de inclusão e exclusão recíprocas, que é dependente da perspectiva da percepção”. (Karin Stempel, 2009). As formas navegatórias vêm das lembranças que tem guardado na memória do homem ribeirinho nascido às margens de um grande rio amazônico. Um mundo imenso de águas é o que banha sua história. 

Em Óbidos, banhada pelas águas lodosas do Rio Amazonas, carregam os sedimentos das florestas e de toda a vida à beira das suas margens. A cidade está fundada na subida de uma ladeira e é de onde se avista a majestade do grande rio, em que o outro lado se perde para sempre no horizonte. Histórias do homem branco, histórias e lendas dos indígenas, histórias do homem indígena que se misturou com as lendas do branco formam o caldo viscoso que dá à humanidade a sua beleza. Klinger transforma essa matéria em suas esculturas e desenhos.

Há muito tempo que as embarcações são o único meio de ir e vir de uma margem à outra. Os pequenos barcos e canoas, como poeira na superfície dos rios, são o meio de sobrevivência para as populações que vivem nas margens da terra banhadas pelas águas. As esculturas nada mais são do que o esqueleto desses barcos gradeados, aludindo a nova forma de habitá-los. De certo modo, reproduzindo as mesmas limitações e medos impostos na vida urbana. 

Certa vez, Klinger contou que gradear os barcos era a maneira desses homens se protegerem do assédio dos piratas pluviais que vagueiam pelos rios trazendo o medo para conviver com a vida simples dos ribeirinhos. Parece não fazer sentido, mas parte dessas histórias (talvez estórias) é que resultam os desenhos das estruturas das embarcações que mais lembram a ossada dos animais vertebrados. São articulações rígidas de linhas simples que são desenhadas de maneira a sustentar esses corpos móveis. 

No início feitas de madeira e cipó, as esculturas de Klinger atingiram sofisticação minimalista, primorosamente bem acabadas e torneadas, sua maneira de interpretar plasticamente as diferentes variações do que enxerga, transformando-as esteticamente em formas simplificadas e equilibradas no chão. Trazem o refinamento visual das peças artesanais. 

Entre os anos de 1999 e 2002, o artista conviveu com construtores de barcos em estaleiros da cidade ribeirinha Abaetetuba, na Amazônia paraense, onde estudou técnicas de carpintaria e engenharia naval para depois aplicar o conhecimento em suas esculturas feitas rusticamente e, depois, com o tempo, essa rusticidade foi sendo apurada. Adquiriu o requinte de mãos habilidosas de marceneiro que as executam a partir dos desenhos de Klinger.  

Nas formas navegatórias, há uma forma central maciça, às vezes mais parecem com um protótipo de uma canoa  aprisionada por forma esquelética, circular, que por si é aprisionada por formas curvilíneas, criando uma tensão.  Para criar estas formas navegantes, nada mais que a estrutura para a construção de barcos, como as costelas do corpo humano que se entrelaçam como variações de curvas e desenhos presos ao ar, estabelecendo o limite e o poder da matéria. 

Formas metafóricas que sedimentam experiências reais, que, mesmo que vividas, guardam apenas evidências geométricas e construtivas das linhas e formas do real, dividindo a realidade com a ficção da vida. A arte nada mais é, melhor, deveria ser, do que a ficção ancorada e aprofundada na realidade. 

Giacometti, em uma conversa com outro artista, Francis Bacon, em Londres, no ano de 1965, disse que acreditava que a ponta da lança da arte é produzir um residual da realidade. Mas disse bem claro não reproduzir, e sim criar uma outra realidade que tenha a mesma intensidade. As formas navegatórias de Klinger Carvalho parecem ser o que são. 

“O barco se encontra como ave exótica em uma jaula. Como a ave que gosta de voar, o barco gosta de navegar, mas se vê impedido de singrar livremente pela jaula”.KS, 2009).

 Ricardo Resende (Curador)

Fonte: galeriakoganamaro.com

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